10 novembro 2008
03 novembro 2008
02 setembro 2008
LXXXVIII Memória
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A filha do homem do táxi era minha amiga, mas também podia pôr o braço à roda da cabeça de um cavalo.
Estava com um homem, estava apaixonada, mas podia igualmente deixá-lo e ir com o desconhecido que vinha do outro lado da rua.
Creio que hoje é Lua Nova. Não há noite mais tranquila. Não correrá sangue em toda a cidade.
Nunca brinquei com ninguém, no entanto nunca abri os olhos e pensei: Agora é a sério. Não é o tempo coisa tão pouco séria?
Nunca fui solitária, nem quando estava só nem quando estava com alguém. Mas gostava de ser finalmente solitária...
(As Asas do Desejo – Wim Wenders)
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01 setembro 2008
26 junho 2008
XXXVI Memória
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O cheiro de rosas velhas e tabaco
Faz-me recordar.
Há quase vinte anos
Que não te vejo
E prossegue o nosso meio amor.
Deixaste-me isto:
Esta mão, entreaberta, imóvel
Sobre uma colcha verde.
Coisa bastante para erguer
Alguns poemas de melancolia.
Tivesse eu então tocado em ti
Talvez um de nós sobrevivesse.
Ian Hamilton
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... marta (doavesso) at 09:21 1 cadernos
13 maio 2008
08 abril 2008
XXXV Memória
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Vergílio Ferreira
(excerto de Aparição)
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03 março 2008
26 fevereiro 2008
23 janeiro 2008
13 janeiro 2008
10 janeiro 2008
XXXII Memória
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Petit Pays (para ti )
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La na céu bo é um estrela
Ki ca ta brilha
Li na mar bo é um areia
Ki cata moja
Espaiod nesse monde fora
So rotcha e mar
Terra pobre chei di amor
Tem morna tem coladera
Terra sabe chei di amor
Tem batuco tem funana
Oi tonte sodade
Sodade sodade
Oi tonte sodade
Sodade sem fim
Petit pays je t'aime beaucoup
Petit petit je l'aime beaucoup
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Cesaria Evora (letra Nando da Cruz)
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05 janeiro 2008
XVI Sonho
Pouco a pouco o sonho dissolve, a nódoa de oiro alastra. Vai mexer com o subterrâneo, acorda os mortos, desenterra o sonho submerso há dois mil anos, sobressalta o instinto, bole com todas as almas sobrepostas até ao fundo da vida. Transforma, volta a existência do avesso, deita o muro abaixo. Por ora é só uma ideia, mas sai-nos de cima o peso do mundo...
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Raul Brandão
Húmus
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28 dezembro 2007
XXXI Memória
... Nuno at 13:49 0 cadernos
19 dezembro 2007
14 dezembro 2007
XXX Memória
Ora bem. Do que eu gostava era de ser tirana. Gostava do poder e do exercício do mesmo. E, como tirana, eu safava-me bem. Garante a minha mãe, que ao contrário de mim nunca mente, que eu alinhava todas as minhas 20 bonecas no sofá da sala e desatava à bofetada. Trra-ta-ta-ta-ta-ta-ta-tau! Aquilo era distribuir bordoadas irmãmente. E barafustava, tinha verdadeiros motivos para lhes puxar os cabelos e esmagar-lhes as cabeças. Ainda hoje do que eu mais gosto é de descarregar a minha raiva nos outros. Mudei de método, claro. Desatar à tareia era capaz de trazer algumas consequências menos agradáveis para o meu lado. Para exercer a minha tirania, também me disfarçava de professora. Fazia ditados às minhas amigas, que eu sabia que escreviam mal, para ter o prazer de corrigir no fim. Também mandava fazer desenhos, porque eu tinha a mania que eu é que era a artista.
Na escola, tinha três brincadeiras preferidas: matar minhocas, adaptar músicas da moda, reescrevendo-as a começar com “saí de casa, blá blá blá…” (o sonho continua) e fazia o pino na parede. Tentava ir sempre que possível de saia, para mostrar as cuecas. Para pinar mostram-se as cuecas, não é? Bom. Lembro-me de certo dia estar eu e uma amiga nesses preparos, que é como quem diz uma ao lado da outra de pernas para o ar e cuequinha à mostra, e passar uma professora e exclamar “que pouca vergonha!”. Com toda a razão.
Contudo, aquilo que eu mais gostava de fazer era beijar miúdas. Todos os pretextos eram bons. Brincar aos médicos, por exemplo. Se eu fosse a médica, podia salvar a minha amiga do afogamento e tinha direito a exercer a preciosa respiração boca-a-boca. Se eu estivesse em apuros…bem, não preciso de continuar. Eu gostava de estar em apuros. Entrava no consultório e dizia “ó doutora, tenho uma dorzinha aqui…não, aí, não, aqui, aqui…”. Sabidolas. Desde pequena a torcer o pepino. Bom. Eu sorrio comprometedoramente sempre que alguém me pergunta quando dei o meu primeiro beijo. Agora já sabem porquê. Lembro-me que fiquei muito desapontada quando a minha principal companheira das beijocas se armou em adulta ou lá o que era e me disse “não, temos de parar com isto, já não somos crianças”, ao que eu respondi “não, eu acho que é ao contrário! Agora que somos crescidas é que devíamos fazer isto mais vezes!”. Eu é que tinha juízo. Alguém me imagina quietinha no meu lugar, santinha aos olhos de Deus? Não desisti da catequese para ficar de mãos atadas. Oops. A verdade é que fiquei muito deprimida quando, já adulta e em conversa com as minhas colegas, percebi que nem todas as miúdas eram assim. Mummy, there’s something wrong with me!
Resumindo, as minhas ocupações passavam por ser tirana, dar tabefes, mostrar as cuecas e beijar miúdas. Não mudou muito desde aí.
Graças a Deus, os putos hoje têm Playstations.
por menina limão
... marta (doavesso) at 01:00 1 cadernos
09 dezembro 2007
XXIX Memória
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fora do amor a vida tem menos tempo, dizias.
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... Nuno at 06:06 1 cadernos
20 novembro 2007
XXVIII Memória
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Escavo o rasto dos teus passos:
o mundo
derrama-se
na cavidade que fica,
volto a amar-te
no limite febril de mim mesmo,
tu folheias, agora terra fina,
os meus remotos
testemunhos.
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Paul Celan
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... Nuno at 13:19 1 cadernos
16 novembro 2007
Ano I
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(os cadernos imaginários)
Herberto Helder
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07 novembro 2007
XV Sonho
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Al Berto
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... marta (doavesso) at 10:35 3 cadernos
16 outubro 2007
XXVII Memória
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Por um rosto chego ao teu rosto,
noutro corpo sei o teu corpo.
Num autocarro, num café me pergunto
porque não falam o que vai
no seu silêncio aqueles cujo olhar
me fala da solidão.
Esqueço-me de mim. Tão quieto
pensando na sua pouca coragem, a minha
sempre adiada. Por um rosto
chegaria o teu rosto, mesmo de um convite
e desenha no ar o hábito
por que andou antes de saíres
do espaço à sua volta. Estás longe,
só assim podes pedir algumas horas
aos meus dias. Sem fixar a voz a tua voz
é uma corda, a minha
um fio a partir-se.
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Helder Moura Pereira
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... Nuno at 19:07 1 cadernos
10 outubro 2007
XXVI Memória
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despi devagar o calor de dizer o teu nome
no silêncio do quarto
o aconchego de se ainda voltasses
abre-se em palavras surdas
depois de improviso percorro a solidão
ao espelho
como se, ao olhar muito te visse
preso na pele dos dedos
inacabado e à deriva nos meus olhos
Maria Sousa
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... marta (doavesso) at 15:44 2 cadernos
12 setembro 2007
XXV Memória
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É noite e arde à nossa volta
tudo o que um dia foi nosso mas perdemos
ao fundo das escadas da infância.
Amadeu Baptista
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... marta (doavesso) at 10:25 1 cadernos
05 setembro 2007
01 setembro 2007
XXIV Memória

... Além de não ter encantos e de estar vestida de uma maneira de que é difícil mostrar o ridículo, eu não me distinguia pela beleza. Era pequena e bastante mal feita, magra, crivada de sardas, sobrecarregada por duas tranças ruivas que me caíam até metade das coxas (digo tranças mas seria mais conveniente dizer cordas, de tal modo a minha mãe apertava e puxava os meus cabelos), estava queimada pelo sol porque na plantação vivíamos mais ou menos sempre fora de casa (e nessa altura a moda em Saigão era a pele branca). As minhas feições, bastante regulares, teriam podido passar por belas mas a expressão hostil, taciturna e obstinada do meu rosto deformava-as completamente e não se dava por elas. Eu tinha um olhar mau que a minha mãe qualificava como "venenoso". Para concluir, quando encontro fotos dessa época, busco em vão uma doçura nas minhas feições, uma suavidade. Os caros amigos da minha mãe diziam que eu viria a ser bonita - que eu possuía uns belos olhos mas era necessário que usasse óculos porque tinha certamente qualquer coisas, o meu olhar não era natural.
Marguerite Duras
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... marta (doavesso) at 21:08 1 cadernos